De verdade
Ela acometeu-lhe sem que antes tivesse percebido que se aproximara. A dor no peito não enganou, era saudade. Assim, tão desafinada, achara não ser. Inocente ser humano.
Esse sopro de agonia o fez andar mais rápido, querendo enganar o coração, justificando o passo largo e arisco como início da garoa que não molhava ninguém. Em um lapso, tudo vira lembrança, e cada detalhe transformou-se no dia em que fugiam do temporal no meio do sítio, depois de colher as pitangas do vizinho às escondidas. O tropeço no tijolo quebrado lembrou o momento em que escorregaram, e, em um pequeno período, relatado em câmera lenta por seu coração nostálgico, elas viraram gotas vermelho-amareladas que pelo céu misturavam-se com o azul-transparente, e, quando não mais tinham força para subir, desceram e viraram risos. E riu, no meio da cidade, da gente, do povo. Desfez o sorriso, achando que ainda enganaria o pobre coração.
Viu em sua frente o sítio. Desistiu de lutar, entregou-se e abriu a porta. Entraram aos risos, ele e seu pai. Sua mãe não entendia o motivo dos risos, mas mesmo assim continuava a preparar a carne com batatas, que já cheirava bem. Mandou-os lavarem-se, e eles apostaram uma nova corrida. A reprovação estava na cara de todos no elevador. Arrumou o blazer e os cabelos, olhando fixamente pra porta, que ao se abrir mostrou a mesa posta, com sua mãe terminando o suco de pitangas do vizinho. Foi correndo pra mesa, mas ela o acertou com a colher e mandou que lavasse as mãos, mas nem sabia mais o que era realidade e o que era a danada da saudade. Até que queimou a mão lavando-a com o café.
Foi ao banheiro assustado, certificando que ninguém vira a cena. Os dedos incharam. Entrou, mas esqueceu-se de que olharia para o espelho. Lá parou, esqueceu-se da mão, do trabalho, da pressa e da garoa. Viu apenas a saudade de dias que jamais voltariam. Olhou seu pai nos olhos, pediu pra voltar. Mas esse o disse, com sábias palavras paternas:
– A saudade é a forma que Deus fez pra que aquilo que é essencial ao coração não morra jamais.
Ficou feliz por um instante, mas não poderia abraçá-lo. Sorriram e ele se virou pra sair do banheiro.
– Filho – disse a mãe – toma.
Sorriu de novo, pegou seu copo de suco, e foi trabalhar.
12 Comentários:
foda demaais! mandou bem, cara, deveras bem!
caramba cara.
eu já vi um curta logo no começo do texto.
depois percebi que pode ser um longa
sem palavras...
deixo o essencial do coração falar.
Du...saudade!
Simplesmente lindo.
Du...
Coincidentemente, essa é minha semana da saudade, amanhã fará 12 anos que meu papai se foi.
Com olhos marejados terminei de ler o texto, que achei incrível! E o que mais mexeu comigo, foi ver que a saudade só perpetua meu pai que ainda é essencial ao meu coração. :)
@Du_
mas que sensivel!
algo me diz que vc é um daquele achados memoraveis da internet.
beijos, sua nova leitora,
@gigia
Po cara faiz um curta veio vai ficar lindo.
Muito bom como sempre,se cuida cara e abração.
Finalizo a leitura com a sensação da saudade de coisas não vividas. Essas se confundem com a saudade real. “Saudade real”, aquela que nos remete aos momentos que antecederam a quase realização dos nossos maiores desejos na vida.
Ah, e você continua escrevendo muito bem.
Beijo =)
Tabata
Olá Eduardo...
Perdoe a invasão.
Te vi no orkut da Joice, e não consegui me conter, cliquei no link do seu blog!
Adorei tanto que te linquei no meu!
Sempre que der vou visitar esse cantinho!
Parabéns
Ate mais
^^'
Ah, não me interprete mal... não me tome como insensível quando lhe desejei 'parabéns', o parabéns foi pelo lindo e emocionate texto dentro desse blog que estou começando a explorar, que me cheira mais lindo ainda!
Quero lhe dizer, que sinto muito, se lhe dói a alma.
Nunca se esqueça de uma coisa: Deus é sabido, e tem o controle de todas as coisas.
;)
Nossa, acho que chorei.
geeeents, que lindo!
=~
boa, duuu.
beijos, beijos.
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